sábado, 3 de fevereiro de 2024

Quinto do MP: aristocrático, arbitrário e oculto


O Tribunal de Justiça – TJ comunicou ao Procurador Geral de Justiça – PGJ a existência de vaga de desembargador a ser preenchida por membro do Ministério Público – MP, em concretização aos arts. 94 e 104, p. ún., II, ambos da Constituição Federal – CF, e 77 da Constituição Estadual – CE/MA, referentes ao quinto constitucional.

O PGJ, presidente do Conselho Superior do Ministério Público – CSMP, editou a Resolução 21/2024, convocando os interessados à vaga. De acordo com o Comunicado CSMP 8/2024, houve nove candidaturas femininas, e catorze masculinas, a nutrir a esperança de que a lista seja de mulheres ou paritária, no mínimo.

O baixo número de desembargadoras, o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável – ODS 5 (Paridade de gênero) da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas – ONU, os programas, ações e diretrizes dos Conselhos Nacional de Justiça – CNJ e do Ministério Público – CNMP voltados à redução da desigualdade de gênero, e a iniciativa da seccional maranhense da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB/MA, certamente estimularão a observância da paridade de gênero, embora não imposta pelo regramento interno do MP/MA.

Os estudos a respeito do procedimento de formação da lista sêxtupla, e dos critérios a serem observados pelos eleitores ativos provocaram algumas reflexões. Inexiste qualquer espécie de consulta aos promotores justiça, aqueles que atendem as populações nos rincões do estado e lidam com violência à mulher e doméstica, ou contra crianças e pessoas idosas, abuso sexual... os mais humanizados e menos burocratizados, pois.

O Conselho de Procuradores – CPMP composto por 34 membros não é ouvido. Apenas os 7 componentes do CSMP tomarão partido, ou seja, a cúria do Vaticano é mais representativa e democrática que a ministerial. Aparentemente não haverá eleição em sessão pública, por meio de votação nominal, aberta e fundamentada.

A Resolução CNMP 244/2022 estabelece critérios objetivos a serem utilizados: eficiência; resolutividade, que contempla a produtividade e o impacto social; desempenho de funções; presteza no exercício das atribuições e; aperfeiçoamento técnico. Dirão que se aplica somente para fins de promoção e remoção por merecimento?

Conquanto a admissão à carreira seja através de provas e títulos, e o aperfeiçoamento incentivado por licenças e bolsas de estudo, as pós-graduações, mestrados e doutorados serão desprezados solenemente? A antiguidade na carreira, tempo de dedicação às atividades fim do MP, efetiva residência na comarca, participação em lista anterior, publicação de trabalhos jurídicos, e docência no ensino superior nada significarão?

Além do compromisso internacional e da possibilidade de uso analógico de norma regulatória cogente, o direito administrativo contemporâneo é regido por atos vinculados ou com discricionariedade regrada, e os princípios da impessoalidade, motivação e publicidade impedem que a formação da lista sêxtupla ministerial seja obra de 7 burocratas, trancados numa sala, a preencher um papel, sem explicação ao cidadão acerca das razões objetivas e republicanas das escolhas.

A interpretação pro persona e o postulado da máxima eficácia sobre o direito de fiscalização popular dos atos estatais, previstos no Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos – PIDCP, e na Convenção Americana sobre Direitos Humanos – CADH, adverte Norberto Bobbio, em lição magistral sobre o tema (O Futuro da Democracia. Paz e Terra, 1986):

não há, nos modelos políticos que consagram a democracia, espaço possível reservado ao mistério. O novo estatuto político brasileiro - que rejeita o poder que oculta e não tolera o poder que se oculta - consagrou a publicidade dos atos e das atividades estatais como valor constitucionalmente assegurado, disciplinando-o, com expressa ressalva para as situações de interesse público, entre os direitos e garantias fundamentais. A Carta Federal, ao proclamar os direitos e deveres individuais e coletivos (art. 5.), enunciou preceitos básicos, cuja compreensão e essencial a caracterização da ordem democrática como um regime do poder visível, ou, na lição expressiva de Bobbio, como “um modelo ideal do governo público em público”.  (MI 284, rel. p/ ac. min. Celso de Mello, pleno, j. 22/11/1991 in Revista Trimestral de Jurisprudência – RTJ v. 139, p. 712)

Há tempo de consultar os promotores de justiça e o CPMP, realizar a eleição em sessão pública, por meio de votação nominal, aberta e fundamentada, para que o MP siga a tendência mundial de horizontalização da atividade decisória, racionalidade e motivação dos atos, e afaste qualquer espectro de predileção pessoal, política ou social.