sexta-feira, 17 de junho de 2011

A Era Wiki Wiki

(Publicado na edição de 15/03/2011 do jornal O Estado do Maranhão)

Segundo a Wikipédia, o termo “Wiki Wiki” pertence ao idioma hawaiano e significa extremamente rápido. As confirmações acadêmica e política do significado vieram quando Karl-Theodor zu Guttenberg perdeu o título de Doutor em Direito, em 22 de fevereiro de 2011, e renunciou ao cargo de Ministro da Defesa da Alemanha, dia 1º de março seguinte, tudo por conta de bombardeio iniciado em 16 de fevereiro passado, por plágio em seu trabalho de doutorado.
No Brasil ocorreu algo parecido, embora bem mais lento, conforme a reportagem “O plágio na era digital”, constante da Revista Veja de 02/03/2011. Segundo a publicação semanal, um doutor em bioquímica foi demitido da Universidade de São Paulo (USP), após um ano de investigação da comissão de ética da USP, por cópia de imagens e gráficos que circulavam livremente pela internet.
A existência do site GutenPlag Wiki, criado para documentar e tornar público o plágio, e a circulação de uma carta-protesto da comunidade científica que logrou chegar às mãos da chanceler Merkel, foram decisivas para colocar o outro Guttenberg alemão na história. Se Johannes (re)inventou a Era da Imprensa no século XV, Karl evidenciou o desdobrar da Era Wiki Wiki hodierna.
Enquanto a página virtual era alimentada, o Judiciário alemão cobrava do governo coerência e “clareza de posição”, segundo noticia o Portal Terra, como se fosse tarefa de magistrado opinar sobre matéria de Defesa Estatal! No outro flanco, os cientistas que abandonaram os laboratórios, tubos de ensaio e microscópios para interferir na condução governamental.
Ninguém duvida que é maravilhoso, rápido e barato viajar a qualquer lugar a bordo do Google Maps, contudo a face apocalíptica da Era Wiki Wiki é que a definição dos papéis dos órgãos estatais e da sociedade organizada está cambiando para algo sem contornos bem delineados e, pior, imprevisível.
Cientistas e juízes se entrincheirando para cobrar a saída de um Ministro da Defesa, sem a instauração de qualquer procedimento que garantisse o lídimo direito de defesa do indivíduo, revela o atual desapreço pelos ideais da Revolução Francesa (Liberdade, Igualdade e Fraternidade), cujo espelho é a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão. No caso brasileiro, pelo menos houve uma comissão de ética, a punição só chegou um ano depois e a matéria ficou restrita ao meio universitário.
A caçada ao ciberativista australiano Julian Assange, fundador da página virtual WikiLeaks onde estão publicados mais de 250 mil documentos diplomáticos americanos, por crimes sexuais na Suécia, lhe rendeu o título de primeiro preso político da Era Wiki Wiki e originou o Anonimous, um exército de hackers de todas as partes do mundo, que se uniram para realizar ataques cibernéticos contra todas as empresas e governos que passaram a boicotar ou dificultar o funcionamento, acesso e manutenção do WikiLeaks.
A guilhotina de ferro que vitimou o rei francês Luís XVI não é diferente do GutenPlag Wiki que defenestrou o ministro alemão Guttenberg. As vidas de pessoas reais estão à mercê de páginas virtuais. Condenações reais tomam lugar com base em acusações eletrônicas. Ideais em declínio, exércitos em ação, batalhas iniciadas, prisões políticas, magistrados se intrometendo em outros círculos de poder, cientistas travestidos de políticos, todos indicadores de que a gestação de uma nova Revolução está em curso.
Tomara que os conflitos se mantenham puramente virtuais ou, no máximo, que se atirem somente frutas, preferencialmente kiwi, pois, caso contrário, o apocalipse daquela Bíblia que Johannes começou a imprimir no século XV, será finalizado por seu conterrâneo Karl, igualmente Guttenberg.
Mas há o que comemorar! Os sítios virtuais GutenPlag Wiki e WikiLeaks constituem provas contundentes que as ações de indivíduos solitários, protegidos pela tela do computador, são suficientes para constranger governos, desmascarar autoridades e destruir títulos outorgados pelas mais respeitáveis instituições universitárias.
Viva a Era do indivíduo com poder político de alcance internacional!

Nenhum comentário:

Postar um comentário