segunda-feira, 3 de abril de 2023

Desembargador pela OAB: herói, soldado, minimalista ou mudo?

Homologadas as candidaturas para o quinto pela OAB, e por ora vencido o debate acerca da possibilidade de sabatina pelo TJMA, pois não se muda regra no curso da partida, a indagação da comunidade jurídica, da sociedade civil organizada e dos jurisdicionados bole com o perfil ideal para o cargo.

Na formação do TSE e dos TREs, os juristas figuram como representantes do povo, porque são os advogados que lutam ao lado do indivíduo contra o Leviatã sancionador, tributador e limitador das liberdades públicas. O terço do STJ e o quinto dos tribunais estão na linha de promover a livre circulação de ideias, a partir de óticas distintas. Mas a que(m) servirá um advogado alçado ao tribunal?

O jusfilósofo estadunidense Cass E. Sunstein, na obra Constitutional Personae (New York: Oxford University Press, 2015) traça quatro perfis: heróis, soldados, minimalistas e mudos. A decisão colegiada será produto da conformação possível entre os quatro modelos, sendo oportuno sublinhar que nenhum concurso público para a magistratura ou ministério público, nem o exame de ordem, tampouco as faculdades de direito do país identificam ou analisam a tendência dos aspirantes.

Os heróis acham que podem direcionar a sociedade e seus supostos anseios através de decisões judiciais, por isso estão dispostos a usar a constituição para derrubar os atos dos parlamentos federal, estadual e municipal, assim corrigindo a lentidão ou inércia dos demais poderes. A criminalização da homofobia corresponde ao ícone do julgamento heroico.

O que caracteriza um soldado, por sua vez, é a maior deferência ao procedimento parlamentar, cabendo-lhe a concretização da atividade legiferante daqueles politicamente eleitos. Não lhe compete, pois, redefinir os valores presentes na ordem normativa vigente. A súmula vinculante 10 retrata esse perfil, ao impedir que ato do poder público seja ignorado.

Já os minimalistas preferem atuações mais cautelosas, centradas nos casos sob julgamento, por temor de repercussões perturbadoras do processo sociopolítico, cuja agenda de discussão e priorização deve ser respeitada. Os costumes sociais consolidados merecem consideração, por isso impossível o rateio de pensão por morte entre a concubina e a viúva, à míngua de manifestação do congresso.

O quarto perfil é o dos mudos, aqueles que repetem a jurisprudência já existente e evitam alterar fundamentos discursivos. Diante de casos difíceis e dos embates que envolvam posicionamentos mais sensíveis, resignam-se e mantém silêncio. Evitam conceder liminares, para não esvaziar o colegiado, e pedem informações em ações constitucionais e agravos, mesmo nas hipóteses de autos eletrônicos.

A primeira lotação do advogado votado pela classe, encaminhado pelo conselho e TJMA, e nomeado pelo governador será uma câmara criminal, a sinalizar que devem ser evitados os candidatos militantes no direito privado. A ótica é robustecida ao perceber que os desembargadores que ingressaram pela OAB fizeram carreira no direito civil, empresarial e imobiliário.

Nenhuma mulher chegou ao tribunal pelo quinto da OAB. Felizmente há várias candidatas com titulação, serviços prestados à Ordem, magistério, e exercício nas funções legislativa e judicante na disputa. Em ordem alfabética: Anna Graziela, Josineile Pedroza e Lorena Saboya são minhas candidatas. Lamento não poder votar em Débora Cartágenes, nem conhecer suficientemente as demais postulantes.

É possível influenciar e controlar as decisões, reforçando o papel da doutrina, evitando concepções realistas sobre o direito. Prevista nos códigos de processo civil e penal, não há notícia de condenação de juízes ao pagamento das custas quando reclamações são julgadas procedentes. Somente o advogado que sofreu com multa por suposta litigância de má-fé, ou abandono, cogitará impor o fel ao concursado.

Espera-se que colegas que tiveram suas prerrogativas violadas, seus escritórios devassados, e sua liberdade ambulatorial tolhida tenham maior sensibilidade ao decidir o pedido urgente em habeas corpus. O CPP, os regimentos internos do STF e do STJ, e a lei de abuso de autoridade autorizam a concessão liminar e monocrática da ordem, mas ninguém da magistratura capitaneia o câmbio paradigmático.

As obras do hospital da mulher se arrastam por longos anos, a indicar que o início da construção do primeiro hospital veterinário de São Luís deveria aguardar a conclusão do nosocômio feminino. Cheios de penduricalhos, ninguém da magistratura, nem do ministério público, tampouco da defensoria pública se insurgiu contra a evidente inversão de prioridade na aplicação de verbas escassas.

Que cada advogada e advogado perceba a importância de votar em colegas que efetivamente introjetem no tribunal a visão que o cidadão possui, não cedendo a sugestões de membros das demais carreiras.



[1] Aldenor Cunha Rebouças Junior (42), advogado (OAB 6.755/MA e 20.159A/RN)

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